terça-feira, fevereiro 16, 2010

GUARANI

Vendo fotos de minha cidade natal, Guarani (MG), não pude
evitar o turbilhão de recordações e, claro, algumas até bem 
engraçadas, outras não tanto, enfim...lembranças!
Passei minha infância lá, de onde saí aos 11 anos.
Minha casa ficava numa rua que beirava o rio Pomba e era esta
a vista que eu tinha dos fundos de minha casa.
A areia, o rio, a chácara do outro lado, as canoas silenciosas,
desenhando em ondas nas águas que refletiam a luz do sol.
Havia também a Maria Fumaça, esta sim cortava o marasmo,
com seu apito, saudade de andar de trem!
Lembro-me de olhar as pessoas que iam e vinham,nas janelas
dos vagões, fantasiando de onde e para onde iam...
o morro da capelinha!...quando em tempo frio, a névoa cobria
a pequena cruz que era  então, para mim, inatingível!
E ainda recordo a emoção que senti ao entrar naquela igreja
pela primeira vez, num passeio de domingo...depois de subir pisando
no capim cheiroso, sob o olhar de um solitário boi, que parecia nos
seguir até o topo!...eu era tão pequena... tudo era alto,enorme, distante...
Havia um coreto na praça! que abrigou móveis numa enchente...
e quando, na oração, foi altar de bênçãos!
mas na política, um palco de mentiras...
no dia a dia, brinquedo das crianças, em riso e correria!
Filme de Mazzaropi com meu pai, o cheiro da pipoca e do cinema,
engraçado...eu chorava na escola e dizia ser saudade,
saudade de meu pai... ele nunca foi embora!
A vergonha na piscina, o triciclo, aniversários,carnaval...
dia de brincar na rua, um vestido pra sujar...
e minha mãe a se zangar! e o menino que eu gostava.
Nunca me perguntaram se eu era feliz lá...e eu nunca soube
o que era aquele aperto no coração, na despedida,
enquanto um caminhão levava tudo,
deixando vazia a casa...e parte de mim, me olhando pela varanda do jardim!
Foi a primeira vez que eu vi lágrimas nos olhos de minha mãe.

sábado, fevereiro 13, 2010

Meu presente de primavera...

Ela nasceu num dia claro de setembro! eu vi com alegria o sol
tomar meu quarto antes do primeiro sinal de sua chegada...
Eu já sabia que seria uma menina, eu sentia meu coração 
"ouvindo" o coraçãozinho dela!
Aisha nunca foi de muito esperar, por isto, nasceu rápido.
Foi o tempo de chegar na maternidade,os preparativos de rotina,
um parto "normalíssimo", como disse a médica cujas mãos a trouxeram ao
mundo!
Mas ela chegou pronta, linda,olhinhos brilhantes, os cabelos escuros que  em 
pouco tempo caíram, tramando naquela cabeça então branca e nua, a cabeleira 
que tem até hoje, a minha ruiva Aisha!
Quisera eu parar o tempo das lembranças que guardo dela, menina...
"Mamãe, o que é pecado?!"...respondi rápido e com carinho, vista a preocupação
naquele rosto em chamas!...não, não existe o pecado para os inocentes!
O pecado mora no coração de quem não "sabe" o amor !!
Carinhosa e guerreira, ela luta quando sabe o que quer!
Quis ser advogada, tudo bem...destino...ela é bem uma justiceira em minha vida...
Quando ela chega em casa à noite, meu dia se ilumina, é assim!!
Aisha não sabe o quanto me passa de segurança e força!
O laço que nos une é pleno, forte! ela é forte! mesmo se debulhando em lágrimas!
mesmo perdoando mágoas...mesmo quando teme a morte...
Gosto de falar de mim para ela.
E ela, quando fala, é de alma e corpo, é a voz presença inteira!
Nada fica para amanhã, ansiedade em pelo, coração na boca!!
Reclama agora, logo depois a gargalhada aporta, a vida chama!!
Minha ruiva e doce Aisha...mesmo quando o vendaval, a pressa!! e ela sai...
águia livre, voa...
deixando tudo em silêncio, cenário imóvel, à espera de sua volta...minha Aisha...
minha filha amiga Aisha, que veio quando ainda era setembro...


*** Significados do nome Aisha:

Do Swahili na África; significa "VIDA"
Variante de escrita do nome  árabe A'isha, que quer dizer "Ela, a que VIVE"

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Felicidade Suprema

Quando soube que estava grávida de minha filha Ananda, minha
vida acabava de dar uma reviravolta. Uma mudança que eu até hoje
chamo de bizarra.
Nosso padrão de vida não era assim, dos piores, morávamos então
de aluguel, mas em uma casa muito boa,que tinha até lavanderia, espaço
para carro e três cachorras, um jardim que era uma delícia de cuidar...
Meus filhos viviam felizes, a cada mês fazíamos compras fartas, inclusive 
roupas e brinquedos!
e na vizinhança havia muitas crianças para compartilhar a vida...
Até que veio o baque: o desemprego. De novo, o sonho acabava...
Fomos, então, morar em Formosa, Goiás. Fica a 1 hora de Brasília, mas nunca
me senti tão longe de TUDO, ao conhecer a cidade. Triste. Seca. Sem alma...e, pior
sem coração! as pessoas se esbarravam nas ruas,mas ninguém parecia amigo de ninguém!
Minha ficha caiu quando paramos em frente à casa em que iríamos morar.
Aisha, que então tinha uns 7 anos, mostrou uma expressão que eu nunca esperei ver
naquele rosto de olhar esverdeado e cheio de planos para o novo lar:
Mamãe!! quero ir embora!!! aqui eu não quero morar, não!!!por favor!
A casa realmente era ruim.Não era uma visão muito animadora
O espaço de fora era tão seco e árido quanto era a cidade...
Uma das cadelas, Baby, fugiu na noite da mudança, acho que ela não gostou
da nova moradia...minha querida Baby...ainda falarei dela, um dia...
O quintal parecia uma selva abandonada e o fato de chegarmos à noite,
exaustos com a viagem, tornou a visão ainda mais difícil...
Naquela noite, em meio a caixas, choro da Aisha e agitação do Tiago, meu
filho mais velho, não consegui dormir, pensando na Baby! sozinha, num lugar
estranho!!...
No dia seguinte, pude ver com mais calma o que me esperava ali:
a casa estava imunda, primeira providência: faxina geral!
Limpa a casa, já era noite...até que, depois das coisas organizadas, o lar
se tornara menos assustador, principalmente para Aisha.
E assim, tentando levar a vida, fomos "descobrindo" o lugar.
Sem boas vindas dos vizinhos, curiosamente minha cadela Batatinha
foi a responsável por eu conhecer a única vizinha de quem fiz questão
de me aproximar: Maria.
Dona de um pequeno bar que servia almoço para peões, era uma mulher
humilde, lutadora, mãe de 3 filhos, cujo pai nunca aparecia...
Ela, até mesmo antes de mim, "intuiu"meu estado:"Está grávida?", 
perguntou-me quando fui atrás da Batatinha, que insistia em fugir para
lá e beliscar petiscos jogados pelos fregueses...
Respondi que não, claro!! era só o que me faltava!!!
Mas aí tocou o alarme:Cadê minha menstruação?!?!! que enjôo foi aquele?!
O susto! nem precisava exame: eu estava,sim, muito grávida!!!!
Quis chorar, me desesperar, minha cabeça doía com a idéia de ter (mais um)
filho e ali, naquele lugar, naquelas circunstâncias!!!
À medida que o tempo passava, o corpo mudando, as crianças se adaptando...
Minha gravidez não foi muito fácil: enjôos até o sétimo mês, pré natal em Brasília,
eu viajava todos os meses para os exames...
Mas quis o UNIverso que Ananda nascesse lá mesmo, em Formosa.
Os médicos do DF acabavam de entrar em greve.
Sentindo as dores do parto, fui à pé para a maternidade, não tínhamos
dinheiro para o táxi!
Mesmo com tudo parecendo difícil, uma luz se acendeu ao chegarmos ao hospital:
Fui muito bem atendida, o obstetra de plantão foi um amor de pessoa,
Ananda nasceu,saudavelmente linda,e clara com os olhos azuis de minha mãe no 
dia de Santa Bárbara,ou Iansã, como preferirem, sob trovões e clarões que eu via
da janela da sala de parto,enquanto a água da chuva lavava os vidros.
Depois das dificuldades com amamentação( eu tive mastite, mas mesmo assim não
desisti de amamentar minha filha!), as coisas começaram a se encaixar, finalmente!
Quando Ananda completava 2 meses, voltamos novamente para Brasília e fomos 
recomeçar a vida, agora já com 3 filhos e sem cachorros...despedida triste para nós...
Mas isto é outra história que,com certeza, ainda quero contar...

Hoje, com Ananda completando 17 anos, agradeço a pessoa maravilhosa que o UNIverso
me deu num momento tão difícil! vejo-a como um presente divino.Ela veio para me 
mostrar que em todas as dificuldades há sempre uma parte boa, uma compensação!

Mas ficou em mim uma pergunta que ainda não consegui responder:
Por que tive que viver um tempo naquele lugar?
Alguma coisa a cumprir, ligada a vidas passadas?
Algo que eu deveria aprender ali que ainda não descobri?
Ou era porque Ananda precisava nascer ali?!
Não sei...o maravilhoso da vida são também estes mistérios!
Mistérios que a gente só desvenda quando chega a hora...
Tudo tem momento certo...e o exato lugar para ser...

Ah, só para esclarecer:
O nome "ANANDA" vem do sânscrito e significa Felicidade Suprema.



quinta-feira, fevereiro 11, 2010

Nós de família...

"Sei que tenho os meus direitos sobre esta casa!!" disse ele com o olhar frio
de sempre, que nunca demonstra sentir nada...e olhava por cima , o
pé esquerdo à frente(esta pose é dele desde menino!), a mão na maçaneta da porta,
como se atendesse a uma indesejável visita...
Medindo 1,58cm, é claro que eu tinha que olhar para cima ao me dirigir a ele!
não gosto de falar com as pessoas sem falar nos olhos!
Meu corpo tremia. Não de medo...mas de uma mistura explosiva de tristeza, de
mágoa, decepção...
Aprendi com meu filho que nunca devemos criar expectativas em relação aos 
outros, porque cada um é diferente! mas eu tentei por muito tempo ensiná-lo a 
respeitar o outro, pela mesma razão: cada um é um universo...engraçado...por
inúmeras vezes o ouvi dizer isto às pessoas.
Mas para ele ninguém parece suficientemente bom e os que o rodeiam, como os
colegas de trabalho,mesmo o chefe..."todos uns bossais, ignorantes, infelizes,não
tenho tempo nem paciência para isso!"...ele nunca pede: manda!
Um dia, e foi a última vez em que falou comigo, me disse com todas as letras:"o
que considerava importante de verdade era criar o filho que acabava de nascer!"
O mesmo filho que mal o vê a cada 20, 30 dias ( e são praticamente vizinhos!).
Talvez seja porque ele pense que, em se tratando de família,não pode haver apego:
"precisa-se praticar a cada dia o desapego, para que não haja decepções nem sentimentos 
materiais, ilusórios!".Sim, ele lê o Baghavaghita!!!..." o que VALE não é deste mundo...
este mundo é transitório, a verdade não mora nos sentimentos terrenos!
Ora, ler e falar é muuuito bonito! concordo e amo os livros dos vedas!
Mas há que se ler e aprender e PRATICAR!! o que não é assim, tão fácil...penso
que se leva vidas para  aprender...
Quando pedi que desocupasse o quarto para que a irmã pudesse usá-lo,(estava de mudança para o próprio apartamento!) vi no olhar dele toda a filosofia de Ghita cair por terra, 
como casa de areia..."este é meu quarto! são meus os direitos!!"
E assim, ele fechou a porta...depois se foi...
Uma vida inteira passou diante dos meus olhos...eu queria gritar, chorar,
xingar até!!meu filho me virou as costas...como se eu fosse nada...como se nada fosse.
E não foi sem emoções terrenas que arranquei a tranca da porta, não foi sem sentimentos
ilusórios que retirei cada "coisa dele" e joguei em caixas,esvaziando o quarto,
levando tudo embora...
Depois de  ver o quarto vazio, me chamar de louca e dizer o quanto eu atrasei
a sua vida, eu percebi que talvez ele nunca mais fale comigo nesta atual existência.
Hoje eu sei que não mais poderia suportar aquela indiferença, todo aquele desprezo,
silêncio e arrogância por muito tempo.
É muito estranho viver ao lado de alguém que simplesmente ignora nossa presença,
desprezando e desrespeitando,sem culpa, nossos espaços e pensamentos! mesmo que 
este alguém seja um filho querido...
A minha escolha veio em consequência daquilo que ele escolheu...
Vai doer por muito tempo.Mas uma coisa me acalma e consola:
Como ele mesmo por várias vezes apregoou para quem quisesse ouvir,
"sempre devemos seguir o caminho do coração".
Como estes caminhos às vezes são difíceis e aparentemente contraditórios!!!
Ele pode nem entender isto algum dia...mas eu obedeci ao comando do meu...
E o que fiz, embora sob o forte efeito de emoções inúmeras, foi exatamente a 
minha última tentativa de mostrá-lo que nem tudo o que é espelho  de nós mesmos
pode ser certo, verdadeiro ou bonito...
Claro que não deixei nem nunca deixarei de amá-lo...mágoas passam...eu sei...e
quero mais é que ele se sinta em paz!!!

No dia 15 de fevereiro completar-se-ão 28 anos que ele nasceu de mim, parto difícil!
Não mais difícil do que a dor de vê-lo indo embora...





 

segunda-feira, fevereiro 01, 2010

BEBETE

Nem sei dizer com exatidão como nos conhecemos, apenas sei
que, quando me lembro de minhas voltas para casa depois das aulas,
lá estava ela! alta, queixo erguido, o uniforme impecavelmente limpo, o
cabelo sempre bem cuidado, lembro-me do brilho dele!! e aquele riso?!
o que era aquilo, meu Deus?!?! ela ria pra iluminar o mundo!!
Os dentes brancos contrastavam, lindos, com a cor de sua pele negra!
A amiga preta mais linda que tive: Bebete!!
Bebete era filha de trabalhadores, casa e família humildes; mas nunca me esqueci
daquele olhar altivo, focado no horizonte...ela não era de baixar a cabeça!!
Raras eram as vezes em que não a via soltar sonoras e lacrimejantes gargalhadas,
o motivo? sei lá...a gente ria de tudo!! bastava, às vezes, uma olhar para a outra,
ou uma palavra que soasse estranha...e lá estávamos "despencando" risos e risos...
Não precisava motivo para rir...tudo era alegria ao lado dela!!
Inteligente, não me lembro que tenha tirado uma nota baixa sequer!
Carinhosa, amável...amiga...
Havia na casa da Bebete um aconchego que eu não sentia em minha casa...
Havia um aconchego no olhar dela...na gargalhada dela...
E assim, como não me lembro bem de como nos conhecemos, também não me
lembro de quando nos separamos...só sei que nunca a esqueci...e sei que ela também
nunca se esqueceu de mim...
Hoje acordei com saudade, muita saudade de você, Bebete!!
Todas as vezes que rio com alguém, uma piada, uma lembrança engraçada,
uma brincadeira...sei lá...tem sempre você...
Quero que saiba que, em cada sorriso meu, mesmo que triste, há sempre uma
sombra iluminada daquele contagiante som feliz que saía de sua boca!

Um dia ainda quem sabe nos veremos de novo e aí, adivinhe...
As lembranças e a alegria nos farão soltar muitas outras deliciosas
gargalhadas...talvez neste exato momento, em algum lugar por aí,
você esteja rindo...